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Galeria Luciana Brito

Gabriela Machado | Cadê o abre alas?

LB News
  • Gabriela Machado, "Cadê o abre alas?", 2017, óleo sobre linho, 14 x 18 cm Foto: Pat Kilgore
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“(Essa mostra contém) soluções específicas para o problema de como

fazer um retângulo pigmentado se sustentar de maneira bonita e inteligente. (...)

Só uma pintura nos fornece, de uma tacada só, um universo de pensamento

e sentimento, nos fisgando, no decorrer do tempo, com surtos de prazer complexo”.¹

 

 

Cadê o Abre Alas? é uma grande exposição de pinturas pequenas e uma pequena exposição de pinturas grandes. Como no atelier da artista, a mostra também contém uma grande estante com pequenas esculturas de cerâmica esmaltada.

Uma das missões da galeria é promover conversas entre o programa de exposições e a residência que ocupa, projetada por Rino Levi. Com isso em vista, adotamos a expografia que Lina Bo Bardi desenvolveu para o MASP, utilizando versões dos seus cavaletes de vidro na luminosa sala de visitas, flanqueada por jardins de Burle-Marx.

No anexo, organizamos uma retrospectiva de 124 pequenas paisagens, datadas de 2016 até 2024. Para essas, optamos por uma montagem sistemática, em ordem de luminosidade. O objetivo é minimizar subjetividade autoral e gerar combinações impensadas. Face a elas, temos duas telas maiores, de 2023. Na sala principal, continua a retrospectiva das pequenas, com 18 nos cavaletes de vidro, também contrastando com telas maiores, de 2023, ocupando paredes em torno.

O convívio entre grandes e pequenas pode suscitar a pergunta: qual o efeito do tamanho da tela sobre o resultado? Tamanho é documento? Telas maiores comportam pincéis mais largos, gestos mais expansivos, maior potencial narrativo. Telas menores exigem pincéis mais finos, gestos mais contidos, maior poder de síntese. Você consegue detectar diferenças de temperamento entre as diferentes medidas?

As telas grandes de fundo branco, gráficas e fortes, evocam os desenhos da artista, onde o corpo se vê mais presente. Já as pequenas, sublimes e contidas, se aproximam, em espírito, de iluminuras medievais, de ícones bizantinos, de miniaturas Mughal. São objetos de devoção saturados de sedução.

Gabriela pinta como quem mantém um diário. Uma respiração que, diferente de alguns de seus mais notados colegas de geração, se dá sem qualquer intermediação que sinalize o esgotamento da pintura modernista. Sinalização que, se existe aqui, se dá no plano da imagem e não do processo, do fim e não do meio; se dá no livre trânsito entre a gestualidade que predominava no seu passado e a representação que domina hoje; se dá no convívio da escrita com a imagem. Aqui tudo é pano para a manga pictórica, até as impactantes e fascinantes esculturas. Obras sem esboços ou estudos, de informalidade enganosa, nascidas de uma imaginação fecunda. Obras informadas pelo conhecimento acumulado em uma longa estrada, por uma habilidade desinteressada em exibicionismo. A primazia é sempre da mão; sua pegada sempre é visível.

Pintar por pintar é um impulso que precede Lascaux. Excetuando as abstrações, é preciso algum pretexto, como uma paisagem. A maioria das obras expostas são paisagens, sem artifício, sem intermediação, sem estêncil, sem régua ou linhas retas. Nelas, nada interfere com o momento mágico em que o pincel encosta na tela, como um par de dedos se encontrando no teto de uma capela. O modernismo e suas vanguardas podem ter desencadeado um processo evolutivo na pintura que desembarcou na última estação -- o monocromo preto ou branco -- mas, para esse ofício, há claramente vida após a extinção. Vida onde pulsões atávicas geram poéticas como essa, que, paradoxalmente, se mantém contemporânea graças à sua atemporalidade.

Oswaldo Corrêa da Costa

 

 

 

¹Peter Schjeldahl, Village Voice, 13 de fevereiro de 1996. Resenha da exposição Screenery, organizada por Joshua Decter na Friedrich Petzel Gallery, Nova York. Tradução do autor.

abertura: 02 de abril, das 18h às 21h

visitação: de 02/04/2024 a 04/05/2024

segunda, das 10h às 18h; terça a sexta, das 10h às 19h; sábado, das 11h às 17h